terça-feira, 29 de maio de 2012

3

I

Bateu uma saudade. Foi forte, deu um tranco no meu ombro, me chacoalhou. Eu estava acomodada, mas agora não estou mais. Sinto falta de tardes passadas à beira-colina, sem dizer nada, só com seis cordas nos dedos. Uma risada e talvez um xingamento, dito baixo, sem ninguém se abalar. Já estávamos acostumados aos tratamentos rudes, porque quando há aquilo que havia, não há necessidade de nada mais.

II

Passei na frente daquela esquina e quase me emocionei. Foi lá que aprendi a misturar conhaque e limão, e tomar tudo num trago, só pra me sentir mais leve. Um showzinho no improviso, só pra tornar a noite um pouco mais alegre. O tempo todo os seus braços estavam ao redor dos meus ombros, como se me protegesse daquele monte de jaquetas de couro, coletes jeans e siglas de bandas de heavy metal. Eu nem tinha mais medo, porque afinal, eu provavelmente era mais macho que todos vocês juntos. Mesmo sendo uma garota. Só que ainda me lembro do cheiro de cigarro e dos escorregões naquele chão liso. As madrugadas atravessadas, rápidas como flechas. E um gosto de eternidade que ficava na boca.

III

Já são três meses, quase quatro. Eu ainda estou sentindo um aperto nos meus lábios; como se o último beijo jamais tivesse terminado. Nunca mais foi a mesma coisa. Um abraço no escuro, um adeus murmurado. Engraçado como, mesmo depois de tudo, eu, que sou eu, com esse jeito de sem-coração e essa frieza, essa mania de amiga-de-todo-mundo, essa falta de ligar pras coisas, ainda ficava sem jeito quando via o reflexo dos seus dentes brancos sob uma luz fraca qualquer. Será que eu consegui superar? Abstinência tem efeitos colaterais. Eu tive que descobrir sozinha. Não havia remédio que curasse o tédio e o vazio.

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