quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Feliz aniversário

Feliz demais para descrever.
Já sinto saudade.

Eu? Assim? Feliz!? Há quanto tempo, hein, felicidade. Honestamente, você tem sido pouco justa com a minha pessoa. Eu merecia mais dessa sensação deliciosa de calor sob a pele, esse frio na barriga. É como se eu nunca tivesse passado por isso antes; uma sensação nova, inimaginável, algo inédito. É como me sinto agora.

- Muito prazer.
Com um aperto de mão, finalmente fomos devidamente apresentados. Um abraço logo em seguida, é claro. E sorrisos. Tantos sorrisos.
Naquela noite, passei por dois momentos que merecem destaque. Primeiro, tive o prazer de dizer "não" àquele que nunca me negou, mas também nunca me deu nada. Segundo, eu pude desfrutar daqueles momentos em que ninguém sabe direito o que está fazendo, embora ambos queiram a mesma coisa. Aquele esqueminha de adolescente de 12 anos, sabe? (Não que eu seja algum tipo de adulta, mas...)
Um olhar acompanhado de um sorriso, um abraço, mais um copo, risadas e mais risadas, e mais copos, e então um alerta na minha cabeça: onde ele está?! Saiu. Com alguém. Buscar um amigo, é o que dizem. Tudo bem. Ele é o anfitrião, não posso roubá-lo só pra mim. Mesmo porque não tenho motivos. Ou tenho? Ou queria ter? Ai, meu Deus.
Eu quero.

Quando o José e o Souza já eram história, as garrafas vazias espalhadas por ali, eu soube que precisava fazer alguma coisa. Ou ir embora, ou tomar uma atitude. Mas eu não estava com meus típicos picos de atitude e coragem de sempre - estava meio travada. Falta de prática, talvez. Ou só medo. Medo?, você pode pensar. Você? Medo de quê? Medo da rejeição que além de possível, era provável.
Mas não. E, para me garantir que meu medo era só uma bobagem da minha cabeça que pensa demais, foi você.

Você sorriu primeiro.

sábado, 25 de agosto de 2012

Manchas de 'talvez'

No papel, milhares de manchas coloridas. Misturas de azul e vermelho. Muito azul. Muito vermelho. Um pouco de verde nos cabelos; no desenho, o vento sopra com força, e o rosto desenhado demonstra tristeza. Talvez, imagino, seja um reflexo do interior de quem pinta. Talvez seja eu, num papel, com mais cor do que a realidade permite. Talvez seja apenas uma face do que está aqui, preso e adormecido, não?, questiono. O papel enrugado e molhado, afinal aquarela usa muita água. O papel sempre esteve molhado, e eu posso nem ter percebido as lágrimas. Ou talvez elas estejam ali, no azul, quando sopro o excesso de água sobre a tinta. Sobre mim mesma, até.

Um dos rostos desenhados está tranquilo. É uma garota, uma garota doce, um pouco triste, admito, mas em paz. Ela tem o cabelo jogado e colorido, como é de esperar, e solta fumaça pelos lábios grossos. Talvez a fumaça seja o meu jeito de representar tudo que quero dizer, mas que ninguém parece ouvir. Como fumaça. Não se pode prender, mal se pode ver. Só existe, sem atenção. Fumaça cor-de-rosa, porque é doce. É doce e delicado. E inútil.
A única coisa em comum entre todos os rostos é que os olhos sempre estão fechados. Sonhando, talvez. Dormindo durante um pequeno momento. Uma piscadela e pronto, meio segundo de sonho, a imaginação à mil. Meio segundo de paz. Talvez, se mantivermos os olhos fechados, como no desenho, por toda a eternidade, possamos sonhar para sempre.
A garota ainda solta pelos lábios grossos as palavras que nunca serão ouvidas. A fumaça delicada e ignorada.

Pássaros, com enormes asas abertas, espantam o que há de ruim. No laranja forte, no verde pacífico, na mistura de várias cores e tons - penas tão coloridas quanto as reais, sim? Escritos perdidos entre um desenho e outro, porque tenho poucas folhas para usar, então abomino o desperdício de espaço. Tudo deve ser preenchido, seja com palavras, seja com cores, seja com manchas, seja com lágrimas, seja com uma pincelada suja, a mistura de todas as cores que possuo.

(Unfinished)

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Cinco laços

O vento sopra
e eu já não posso mais te ver
te levou embora
Se o sol se vai, começa a chover

Cinco laços
não há nada que possa
dizer ou fazer
que não me faça lembrar
e que eu possa esquecer

O verbo que te leva
é o mesmo que te trouxe aqui
Um capitão sem rumo
que encontrou em mim o seu navio
A âncora deixou a sua marca
mas pode ir em paz
alguém no passado me ensinou
a não correr atrás

O vento sopra
eu fecho a janela do meu quarto
(...)


domingo, 5 de agosto de 2012

À minha esquerda

O rapaz à minha esquerda segurava meus dedos com certo desespero. Amigos são pra isso; "aperte minha mão o quanto precisar, eu estou aqui". O outro, à minha direita, tinha olhos bonitos. E eu achei melhor avisá-lo do fato.
O rapaz à minha esquerda estava muito mais bêbado do que deveria, mas o que eu podia fazer? Já era muito bom que estivesse apenas bêbado. Mas ele continuava com aquele olhar perdido que tirava o meu rumo e também o meu sossego. Como se procurasse uma forma de fugir. E existem tantas...
Mas o rapaz à minha esquerda é muito mais forte do que eu julgara a princípio. Ele disse não, ele preferiu minhas mãos quentes e um pouco de grosseria. Eu queria poder abraçá-lo e garantir-lhe que, pela manhã, mal se lembraria de tudo e esta teria sido apenas mais uma noite, mas o amanhecer se aproximava de forma rápida, e eu não queria mentir. Nem poderia, na verdade. Ele saberia. Ele já sabia.

À minha direita, os olhos bonitos foram tomados pela vermelhidão típica, mas a conversa não perdeu o rumo. Havia algo de verde naquele olhar tranquilo. Talvez seja italiano, pensei. Muito branco e muito barulhento. Quando gritou com os amigos, tive certeza: italianíssimo.

Mas naquela mesa de bar, àquela hora da manhã, eu já não podia deixar de perceber que o rapaz à minha esquerda se fechava mais e mais contra sua própria vontade. Algumas risadas escapavam da boca cerrada, mas ele já piscava mais devagar e começava a se entregar. Não ao sono, não ao cansaço, não ao álcool corroendo suas veias. Começava a se entregar àquilo que lhe tomava as forças, algo sem nome, sem cor e sem cheiro, mas com uma força inacreditável. Eu apertei seus dedos, senti sua pulsação, tentava salvá-lo. Mas não podia. Não ali.
" Vamos?", convidei. "Tenho que ir embora em duas horas."
Ele sorriu. Não entendi esse sorriso.
Nunca entendo seus sorrisos.

Caminhamos pelos paralelepípedos à luz de postes elétricos, de mãos dadas por causa do frio, eu com a camisa dele.
Porque, apesar de tudo, ainda existe o cavalheirismo.

Conforme o caminho surgia e nosso destino chegava, eu ia criando uma consciência plena de que estávamos bem. Estava tudo bem. Nossos dedos entrelaçados eram muito raros, porque eram apenas dedos entrelaçados, sem entrelinhas. Estávamos em paz.
Mas é claro que quando a calmaria é grande...
Tinha que ser eu. Ele era bom demais e amigo demais e talvez até estivesse bêbado demais para perceber que eu resistia com força à tudo que me atirava naquela direção. Mas eu estava mais fraca, e num momento de loucura houve um deslize, um delírio, e acabou. Eu tinha feito.
Ele riu. Aquela risada que eu não decifrava, o sorriso que eu não entendia.
Usou um termo que eu não gosto para descrever erroneamente uma situação que eu havia causado. Tudo errado. Estava tudo errado. E, pra piorar tudo, ele deixou.
Por que ele deixou?

Na mesa do boteco eu anunciara à quem quisesse ouvir que havia um combinado. Um combinado que era nada mais que um limite. Algo que eu impusera. E agora, eu o quebrara.
Com ajuda.
Éramos dois idiotas.

Resolvido o problema e enterrado ali, naquela esquina, seguimos caminho.
Havia uma garçonete. Alargadores, cabelo ruivo, chopp grátis.
E havia ele, meu companheiro de boteco. Eu o entregaria nas mãos de quem derramava chopp bar adentro. Sem remorso, sem dor. Apenas alívio. Ela era boa com as mãos.

Não se passaram dez minutos. Eu juro pelo que há de mais sagrado.
O deixei na porta do bar, nos braços da ruiva, com seu sorriso gentil e seu jeito de menina. E ele, sorridente - como sempre. Desejei boa noite e virei para o outro lado. Desci o quarteirão e, sem pensar duas vezes, entrei. Subi o elevador, com sua velocidade super sônica, e logo estava dentro do apartamento, procurando um lugar pra dormir. Haviam corpos demais pelo chão, poucos colchões - e de repente, o interfone. O porteiro anunciou o nome de quem devia estar em mãos que derrubam chopp. Mandei subir, sai do apartamento e fui esperar no elevador. Haviam dois motivos: 1) eu queria saber por que estava voltando tão cedo e 2) não podia deixá-lo fazer qualquer barulho.
Quando a porta do elevador abriu, ele veio de cabeça baixa, muito rápido. Ficou surpreso por me encontrar ali, esperando.
- O que você está fazendo aqui?
- Vim pra você não poder fazer barulho.

Ele tomou minha mão e seguimos corredor adentro.
Entramos no apartamento, e eu disse "Fique quieto."
Depois disso, ficou tudo escuro. E tenso. E embaçado.
Eu já não sentia. E eu lutava muito contra, enquanto meu corpo clamava; clamava pelo calor. Pelo toque. Pela proximidade.
Ouve uma explosão, e ele sorriu.
Ele sorriu, e eu finalmente entendi seu sorriso.