quinta-feira, 29 de março de 2012

Veio

Veio para acordar o que estava calmo.
Para me ver debater
entre dois travesseiros,
mexer com o que estava quieto
há algum tempo.
Veio para ser outra vez o meu tormento.
Tornar-se outra vez necessário;
tornar-me outra vez dependente.
Despertou a saudade.
Do teu corpo quente,
do teu sorriso branco,
do teu hálito morno.
Dos beijos com que você
pagava o meu suborno.
Veio para reavivar
um sentimento que já estava morto.

domingo, 25 de março de 2012

Ela não queria batatas no forno

Está com 27 anos.
Ela sempre se imaginou morando em um apartamento pequeno, talvez uma cobertura barata, de paredes velhas, tijolinho à vista, com janelas imensas de vidro; um espaço de uns 200 metros quadrados sem divisórias. Uma banheira antiga, uma cama de mola, umas cadeiras e vários quadros grandes nas paredes. De preferência fora do Brasil. Não precisava ser New York nem Paris; ela aceitava uma cidade pequena, com poucos prédios, um jornaleco onde trabalhar e ruas tranquilas por onde pudesse passar de madrugada, sozinha, sem temer a próxima esquina. Imaginava-se solteira, com talvez um amante de quintas-feiras. Seria amiga do dono do café, que saberia de cor o seu pedido, um cappuccino açucarado e talvez até um biscoito de baunilha para acompanhar.

Mas ela se encontrava no segundo andar de sua semi-mansão, luxuosa, vista para o mar. O filho mais velho batia em qualquer coisa de metal no quarto ao lado, enquanto o mais novo gritava por comida, lá na cozinha. Ela estava cansada, mas ninguém entendia, afinal, o que uma dona-de-casa faz que a deixa tão cansada? Olhou para o relógio: 18h02. Ele ia chegar à qualquer momento, e não havia terminado de assar as batatas. Se as malditas batatas não estivessem prontas, sabe-se lá Deus o que ele ia quebrar dessa vez; ela torcia para que não fosse outro osso. Aumentou a temperatura do forno no mesmo instante em que ouviu o porteiro eletrônico sussurrar em sua voz metálica que o portão havia sido aberto. Tarde demais. 18h04. Não havia mais tempo. Colocou as panelas na mesa, espalhou os talheres e gritou para os meninos descerem. 18h06. Devia ter ido direto para o quarto, tirar os sapatos de $2.000 que tanto gostava. 18h07. As batatas continuam no forno. "Mulher!", ele grita, e o coraçãozinho frágil dela pula para a garganta. "Mulher", não, por favor. Mal sinal. "Está surda? Suba!". Ela esconde o desespero entre os cabelos curtos cacheados, arranca o avental de linho numa puxada e sobe as escadas. Não sabe o que é pior: demorar para chegar, ou chegar. Ele está com o blazer na mão, um sorriso irônico no rosto. "Feche a porta". Ela nem se vira: estica a mão e fecha a porta de madeira maciça, pronta para mais uma sessão rápida de sofrimento.
As batatas ainda estão no forno, e ela só queria estar num apartamento de 200m², com janelas grandes de vidro e uns quadros pelas paredes.

sábado, 24 de março de 2012

TAE

Sempre fugiu ao meu entendimento a incapacidade que certas pessoas (sem indiretas) têm de prolongar o próprio sofrimento. Elas mantêm seus pensamentos e sentimentos direcionados para aquilo que as machucou, independente de ter sido ontem ou há três anos atrás. Isso não fazia qualquer sentido pra mim. Quando algo nos machuca, nós fugimos disso, escondemos as cicatrizes sob mangas longas e procuramos novas quinas para batermos o cotovelo. Ou seria isso o correto, o natural. É o que o nosso corpo faz contra qualquer choque, seja mecânico ou psicológico.
Então, quando eu me vi na situação que eu sempre julguei inteiramente insana, tive três reações instantâneas: rir de mim mesma, chorar pela minha falta de senso comum e procurar uma saída. E foi procurando a saída que eu finalmente entendi que as pessoas não prolongam suas dores; elas simplesmente não sabem como deixá-las para trás. Sendo assim, criei o que eu mesma chamo de TAE - Tratamento Anti-Ele.
Você ignora. Você ignora. Você ignora. Mas não é só não responder as mensagens, não. Você não lê as atualizações do Facebook. Você não fala com ele por msn. Você não atende ligações. Você não conversa sobre ele, não desabafa sobre ele, não pensa nele. Você chora quietinha de saudade e não conta pra ninguém; e engole a humildade. Não engole o orgulho, não. Engole a humildade. Você pensa em si mesma como alguém que simplesmente não tem tempo nem paciência pra gastar com, pfff, ele.
Na verdade, é desgastante. Mentir primeiramente para si mesma, depois para quem está ao seu redor, e depois para ele. E não é tentar enganar, é mentir. Fingir. Com o tempo, a mentira vai virando a realidade, e o que antes você só queria que fosse verdade, se torna real. Com o tempo, as coisas mudam de figura, as cicatrizes finalmente secam e o seu coraçãozinho machucado volta a bater.

Você está pronta para um novo começo.





segunda-feira, 12 de março de 2012

Cheiro de chuva é coisa de interior

- Está sentindo esse cheiro?
- Que... que cheiro!?
- Esse cheiro de chuva. Você não tá sentindo?
- Cheiro de chuva? E desde quando chuva tem cheiro?
- Lá na minha cidade tem.
- Lá vem ela...
- E aqui também, mas aqui fica cheirando a asfalto. Lá cheira terra.
- Ah, menina, você é muito caipira.
- Pelo amor de Deus, use o seu olfato. Sente esse cheiro.
- Não tem cheiro nenhum.
- Você não sabe sentir cheiro, rapaz?
- Cheiro de terra? E eu lá vou querer sentir cheiro de mato?
- Quando você for comigo pra minha cidade, você vai entender.
- Nunca vou entender.
- É o melhor cheiro do mundo.
- E desde quando qualquer coisa relacionada a chuva é boa?
- Chuva é ótima.
- Nem sei como está chovendo, tava um sol horrível agora há pouco...
- Meu Deus, que cheiro bom.
- Para de falar desse cheiro de interior.
- O cheiro é de terra. De chuva, na verdade.
- Nem você sabe.
Olham através da janela da sala de aula. Estão no quarto andar. Ela sorri para as ruas asfaltadas e observam o cinza se tornar preto debaixo dos pneus dos carros.
- Sempre que chove, alaga algum lugar.
- Não é bem assim.
- É sim. Chuva só traz coisas ruins para as cidades.
- Ouve o que você tá falando, cara.
- É sim. Devia chover só no sítio.
- E como é que nós íamos nos refrescar? Olha esse calor infernal! Agradeço pela chuva, valeu São Pedro.
- Você é muito do sítio, mesmo.
- E você é muito urbano, não dá valor.
Um minuto de silêncio, enquanto ele via ela sorrir de novo, os olhos piscando pesado, a alegria guardadinha no coração cheio de saudade de casa.
- Lá... você saia na chuva?
- Sempre que podia.

Ainda está chovendo quando eles descem as escadas, e quando chegam no ponto. Ele entra no ônibus, mas ela continua a pé. Ele pensa em chamar, em dizer de novo que ela é louca, mas sabe o quando importa ter um pedacinho de casa por perto. O pedacinho dele acabava de dobrar a esquina.

sábado, 10 de março de 2012

Tão pouco europeu

Era tão francês; até o modo como mexia o seu café. Nos seus dentes francamente brancos, o reflexo de alguns dias ruins. Porque, sabe, as coisas ruins marcam a gente. O mais engraçado é que nem sempre fora tão francês, tão clichê, tão listado. Era bem americano, com seus McDonalds e sua mania de CDs e gordura saturada. Mas nem agora, francês, gostava de chuva; preferiria inteiramente um dia no shopping à um dia num café. Tão pouco europeu.

Só que nas marcas dos dedos, eu via que era mais másculo do que o francês permitia, mais delicado que o alemão aceitava, menos gordo do que o americano seria, tão bonito quanto qualquer grego nascia. Nos olhares escuros lançados, que não reluziam à luz forte do meio-dia, haviam sorriso tortos, de canto de boca, chorando. Mascava chiclete e carregava um livro. Conquistou.

Passava o dia à tinta e papel, porque era escritor por fora, e carregava sua Polaroid antiga, comprada à preço caro, porque era fotógrafo imediatista por dentro. Não queria para amanhã, queria para ontem, porque nem o hoje era rápido suficiente. Para um fotógrafo nato, aguentava pouco a tensão da darkroom. Imediatismo? Não era francês. (Tão pouco europeu.)

Só que conquistava mulherzinhas de pouca índole; aquelas que procuravam um romance nada original que seria contado em rodas de vinho barato, às nove da noite, em alguma reunião semanal de amigas antigas. Além de mainstream, pouco europeu. Mas ele?, ele não ligava, porque para cada romancezinho, criava uma personagenzinha, que conquistaria milhares de leitorezinhos e lhe traria um dinheiro nada 'zinho'.
Ligava demais para a casa em que vivia e a comida que comia.

Tão pouco europeu.

sexta-feira, 9 de março de 2012

Previsão concretizada



Oi, gente!
Faz tempo que eu não faço um post, né? Só textos e textos e textos de amor, saudade, viadagem pura, etc.
Agora eu voltei um pouco pra contar uma coisa MUUUUITO legal que aconteceu, e que eu achei digno de compartilhar com vocês.

Eu estava em uma loja aqui em Apiaí, esperando na fila pra pagar (oh lord), quando encontrei uma revista e comecei a dar uma olhada. Era uma revista antiga do Inverno 2011, mas mesmo assim, achei interessante dar uma olhada. E qual não foi a minha surpresa quando, de repente, uma página sobre sapatos da moda 2011 mostrava um modelo que eu apostei como tendência aqui, no BdA! Nesse post aqui, que eu falei sobre as possíveis tendências de inverno (mas que foi bem pouco visto), eu disse que um oxford de salto, da marca Werner - marca nacional, lá do Rio Grande do Sul - seria uma mega tendência... e não era ele, justo ele, que estava na revista? A foto é a mesma!, e eu vou mostrá-la aqui pra vocês (a foto foi tirada com o celular, então não liguem):




Então é isso, eu só queria mostrar pra você porque fiquei muito feliz com essa coincidência incrível.
Logo menos eu faço mais posts, ou mais textos.
=)