terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Charlie (Um, Dois, Três Contos Sem Fim)

Era noite de terça-feira, e lá ia eu. Dia de jogo, eu precisava assistir o meu amado Browns vencer. Com essa vitória, era líder do campeonato com 5 pontos de distância do Dark Bulls, segundo colocado. Eu precisava da vitória para ganhar a aposta com Sony, ou eu estaria devendo oficialmente três caixas de Guiness para um velho grisalho.

Entrei no Poney Town – pois é, o nome é definitivamente estúpido –, e dei de cara com um bando de quarentões gorduchos com os olhos esbugalhados, colados na tela da plasma 42’ pendurada bem em cima da placa que dizia Não assiste se não beber!. Judy, a barman, estava ocupada com um monte de louça da hora do almoço que alguém (provavelmente Lewis, seu marido) não lavara. Me lançou um alô com um aceno e um sorriso desesperado. Sentei então em um dos bancos altos de couro, e apoiei os braços na bancada de madeira velha. Ao meu lado, em uma fila perfeita em ordem decrescente, quatro gorduchos não desgrudavam os olhos da tela da TV. Eu os conhecia: Philip, John, Kurt e Alguma-Coisa Paul. Eram loucos por futebol quase tanto quanto eu, mas gostavam mesmo era de F1. Estava passando a final do GP da Irlanda e, como provavelmente eram pobres demais para conseguirem voar para Dublin para assistir a corrida, estavam ali, no Poney Town, cada um com sua respectiva Guiness, os quatro quase chorando. Não faço idéia de quem ganhou, mas com certeza não era o cara pra quem eles estavam torcendo.
– Alemães filhos-da-puta! – gritou Kurt, exasperado. Era o que estava mais longe de mim, logo na outra ponta. Era baixinho, baixinho mesmo, e definitivamente engraçado. O rostinho redondo ficou vermelho quando ele gritou, as perninhas esticadas como palitos de dente fincadas numa batata gorda. Dei uma gargalhada silenciosa.
Nenhum dos companheiros do Palitos na Batata deram qualquer opinião, mas fiquei com pena de todos eles; pareciam arrasados, como se eles mesmos tivessem perdido a corrida, cada um em seu carrinho à jato.
Me sentei ao lado de Philip, o único dos quatro que eu realmente conhecia, porque era amigo de Sony.
– Ei, Phil – cumprimentei. – Sinto muito pela corrida. Vamos ganhar a próxima?
Nai – respondeu, desanimado. – Somos péssimos.
– Veio ver o jogo, Charlie? – perguntou John, quando eu não respondi Philip.
– Vim assistir a vitória do Browns – respondi, sorrindo. – Os Bulls estão péssimos, então se ganharmos do Tirany hoje, garantimos o campeonato. Vai ser demais.
– Charlie, querida, eu não queria te dizer isso, mas os Browns não vão ganhar! Claro que não vão! – gritou Sony, entrando no Poney Town. Nada melhor do que a companhia do seu pai, que torce para o time adversário, dentro de um bar que ele mesmo lhe ensinou a freqüentar.
– Sony – eu já não o chamava de pai há algum tempo –, eu sinto muito mesmo, mas acho que agora sim, você pirou. Os Bulls estão terríveis, não existe a menor chance de perdermos hoje e, mesmo que os Browns percam (o que é impossível),vocês precisam de cinco pontos para terem chance de vencer.
– Apenas cinco pontos. Com a sua derrota hoje e a nossa vitória amanhã, a distância será de dois pontos. Vai ser fácil.
Nem preciso dizer que o Browns perdeu, o Bulls ganhou no dia seguinte e acabou vencendo o campeonato.

Mas eu devo as caixas de Guiness à Sony até hoje. Não pretendo pagar.

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